Cipó-ambé: o ‘cigarro de índio’ que hidrata, cura e vira artesanato na Amazônia

Planta amazônica serve como fonte de água potável na floresta, é usada na medicina tradicional, no artesanato e até como cigarro natural por comunidades indígenas e ribeirinhas.

Foto: Reprodução/Youtube-Nossas Histórias
Árvore do cipó-ambé, planta com vários usos na Amazônia. Crédito: Reprodução/Youtube-Nossas Histórias

Na imensidão da floresta amazônica, pendendo das árvores mais altas até tocar o chão da mata úmida, cresce o cipó-ambé (Philodendron spp.), uma planta de aparência simples, mas de usos surpreendentes. Conhecido por muitos nomes populares, como “cigarro de índio”, esse cipó é reverenciado por comunidades tradicionais e indígenas por suas múltiplas utilidades: hidratação, medicina natural, fumo e artesanato.

Essa trepadeira pertence ao gênero Philodendron, comum nas florestas tropicais da América do Sul. Ela cresce em touceiras, escalando árvores com seus longos caules verdes, e guarda um segredo vital: quando cortado ainda jovem, seu interior libera um líquido fresco e cristalino, a chamada “água de cipó”. Em caminhadas pela mata, essa água serve como fonte confiável de hidratação.

“Se você se perder na mata, procure um cipó-ambé", ensinam os mais antigos. A planta se tornou, assim, não só um símbolo de sobrevivência, mas também uma ponte entre o conhecimento ancestral e o uso prático no dia a dia da floresta.

O ‘cigarro de índio’ e a tradição oral

A jornalista Regina Volpato prova o "cigarro" do cipó-ambé. Crédito: Divulgação Canal Regina Volpato

Outro uso curioso do cipó-ambé é como cigarro natural. Conhecido como “cigarro de índio”, ele é preparado com simplicidade e precisão. O cipó é colhido, cortado em pedaços, deixado ao sol por dois dias, e então a casca externa é removida. O miolo, após seco e endurecido, está pronto para ser fumado.

A tradição é mantida viva por moradores da floresta e já despertou curiosidade em visitantes. A jornalista Regina Volpato, por exemplo, registrou sua experiência ao fumar o cipó durante uma visita a Alter do Chão (PA). Em seu canal, ela mostra o momento em que experimenta o “cigarro de madeira” com auxílio de um guia local, que comenta: “Quando traga, é a melhor coisa que tem pra acalmar”.

Mais do que um simples hábito, fumar cipó-ambé carrega um valor simbólico e espiritual, relacionado ao equilíbrio, à conexão com a natureza e ao saber tradicional transmitido oralmente entre gerações.

Medicina, artesanato e saber ancestral

Nas comunidades amazônicas, o cipó-ambé também ocupa um papel importante na medicina popular. Ele é usado como fitoterápico, em receitas caseiras que tratam desde picadas de cobra até inflamações. No livro Algumas espécies de plantas reunidas por famílias e suas propriedades, o pesquisador George Duarte Ribeiro descreve a planta como medicinal e de amplo uso doméstico.

Além disso, o cipó tem valor econômico e artístico. É matéria-prima para utensílios domésticos, cestos e objetos de decoração produzidos artesanalmente por comunidades ribeirinhas. O estudo “Etnografia da produção de artefatos e artesanatos em comunidades da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã”, da pesquisadora Marília J. S. Sousa (UFAM/IDSM), detalha o uso da planta como base estrutural para a produção artesanal em regiões do Médio Solimões.

Uma farmácia viva da floresta

Considerado uma “farmácia viva”, o cipó-ambé continua a despertar o interesse da ciência. Pesquisadores buscam compreender os princípios ativos presentes em sua composição, com potencial para aplicação na medicina moderna. Ao mesmo tempo, cresce a valorização do conhecimento empírico das populações tradicionais.

A versatilidade do cipó-ambé reflete a riqueza da biodiversidade amazônica e a sabedoria de seus povos. Em cada uso – seja como bebida, remédio, cigarro ou arte – ele traduz o profundo respeito e a integração entre o ser humano e a floresta.

Referências da notícia

Portal Amazônia. Cipó-ambé: ‘cigarro de índio’ e uma fonte de água na floresta amazônica. 2025