Cientistas do mundo todo aram décadas tentando desvendar um dos maiores mistérios das mudanças climáticas: quanto carbono as florestas tropicais do planeta realmente armazenam? Com mais de 1,5 trilhão de árvores espalhadas por florestas tão vastas quanto a Amazônia, o Congo e as selvas da Indonésia, a tarefa tem sido, até agora, intransponível. Mas isso está prestes a mudar.
Na terça-feira, a Agência Espacial Europeia (ESA) lançou com sucesso o satélite Biomass a partir da Guiana sa, projetado para observar além da cobertura verde das florestas e mergulhar em seus segredos mais profundos: os troncos e galhos que escondem a maior parte do carbono da floresta. Esta é a primeira vez que um satélite consegue medir diretamente quanta biomassa lenhosa existe nas florestas do planeta.
Esse avanço é possível graças a um instrumento inovador: uma antena de 12 metros de diâmetro, semelhante a um guarda-chuva, que usa radar de banda P, uma frequência com comprimentos de onda muito maiores do que os usados por satélites anteriores.
️ Our groundbreaking Biomass satellite lifted off on Vega-C #VV26 from Europes Spaceport in French Guiana at 10:15 BST/11:15 CEST on 29 April. The satellite is designed to provide unprecedented insights into the worlds forests and their crucial role in Earths carbon cycle. pic.twitter.com/rCUyDPri6W
— European Space Agency (@esa) April 29, 2025
“A maioria dos radares que temos no espaço hoje vê a copa das árvores, os galhos, as folhas; eles não penetram na floresta”, explicou o Dr. Ralph Cordey, diretor de geociências da empresa Airbus. “Mas com esse comprimento de onda, podemos ver profundamente nas árvores e florestas”, complementou.
O satélite funciona de maneira semelhante a uma tomografia computadorizada. Ao fazer várias agens sobre as mesmas áreas, o radar construirá imagens tridimensionais do interior da floresta, permitindo um cálculo preciso da quantidade de carbono armazenado na madeira.
Essa capacidade, combinada com a habilidade de observar através das nuvens — essencial em regiões tropicais com céu quase sempre nublado — marca uma diferença radical em comparação com missões anteriores como o Landsat.
“Basicamente, estamos tentando calcular a quantidade de carbono em 1,5 trilhão de árvores nos trópicos”, disse o professor Mat Disney, do University College London. "Nosso conhecimento atual é muito fragmentado porque isso é muito difícil de medir. Satélites são realmente a única maneira de fazer isso de forma consistente", acrescentou.
Cinquenta empresas participaram do desenvolvimento do satélite, liderado pela Airbus no Reino Unido, com a colaboração da empresa americana L3Harris Technologies, especializada em antenas espaciais implantáveis em larga escala.
O satélite Biomassa é o resultado de mais de 20 anos de trabalho científico e de engenharia. O projeto foi liderado pelo físico britânico Shaun Quegan, da Universidade de Sheffield, e John Remedios, do Centro Nacional de Observação da Terra, que expressaram seu entusiasmo: "Queremos investigar essas florestas. Podemos realmente olhar para dentro delas", disseram.
And Vega-C's fairing just opened to reveal Biomass!
— ESA Space Transport (@ESA_transport) April 29, 2025
The AVUM+ stage is still connected and working to make sure it will place @ESA_EO's mission in its precise orbit #VV26 pic.twitter.com/Pe7bR29U35
Nos próximos seis meses, a equipe do Biomassa começará a gerar os primeiros mapas globais de biomassa florestal, com atualizações anuais planejadas para a duração da missão de cinco anos. Esses dados nos permitirão entender não apenas quanto carbono permanece armazenado, mas também quanto é perdido devido ao desmatamento.
Líderes mundiais se comprometeram a interromper a perda de florestas até 2030, mas o desmatamento continua aumentando. Com este novo instrumento, os cientistas terão uma ferramenta de precisão para monitorar esse compromisso e avaliar o verdadeiro papel das florestas como sumidouros de carbono.
“É emocionante porque revelará como algo que talvez consideremos natural — nossas florestas, nossas árvores — contribui para os processos que governam nosso planeta”, concluiu o Dr. Cordey. “E, em particular, aos processos que impulsionam as mudanças climáticas, que são tão importantes para nós hoje e para o futuro”, finalizou.