As “megassecas” são eventos de seca que se estendem por vários anos consecutivos, provocando graves impactos no meio ambiente e nas populações humanas. Essas secas multianuais estão se tornando mais frequentes e intensas devido às mudanças climáticas globais.
Além disso, esses eventos prolongados estão tornando o solo mais seco, o ar mais quente e reduzindo a vitalidade da vegetação. A pesquisa reforça a urgência de medidas de mitigação e adaptação para lidar com esses desafios crescentes.
No estudo, o SPEI (Índice de Precipitação e Evapotranspiração Padronizado) foi usado para identificar e quantificar as secas, incluindo as megassecas, ao medir as variações na quantidade de precipitação e evapotranspiração (evaporação das superfícies somado à transpiração das plantas) em um determinado período.
Calculado com base na diferença entre a precipitação observada e a evapotranspiração potencial (uma medida de quanto vapor de água seria liberado do solo e vegetação para a atmosfera em condições ideais de umidade do solo), a anomalia negativa do SPEI indica déficits de precipitação, ou seja, períodos mais secos do que o normal.
Para definir as megassecas, o estudo utilizou eventos com anomalias negativas significativas no SPEI, durando pelo menos dois anos consecutivos, resultando na identificação de 13.176 megassecas.
A severidade das megassecas foi determinada pela combinação da área afetada e da intensidade das anomalias no SPEI, considerando critérios como duração, extensão territorial, e desvios de temperatura e precipitação ao longo do tempo.
A imagem abaixo, extraída do estudo, ilustra a localização dos 10 eventos mais severos de megassecas no mundo, destacando a duração (representada pela escala de cores) e o período de ocorrência. O evento mais severo ocorreu nos Estados Unidos, entre 2008 e 2014. Na bacia Congo oriental, na África, ocorreu a megasseca mais longa, durando quase uma década, entre 2010 e 2018, ocupando a 4ª posição na lista de severidade. Já na América do Sul, destacam-se a 7ª e 9ª posições de megassecas mais severas como os eventos sudoeste da Amazônia e na região Sudeste do Brasil.
A megasseca no sudoeste da Amazônia foi a segunda mais longa do conjunto analisado, ela ocorreu entre 2010 e 2018, durando quase nove anos. Seu pico de área afetada ocorreu em 2015, período que se sobrepõe à segunda megasseca mais severa da América do Sul: na região Sudeste do Brasil, entre 2014 e 2017. Essa foi a pior seca da cidade de São Paulo, onde o reservatório da Cantareira alcançou o chamado ‘volume morto’ - um volume de reserva abaixo das comportas da represa.
A análise mostrou que o déficit de precipitação foi o principal impulsionador das megassecas, mas o aumento na evapotranspiração potencial também teve um papel importante, especialmente nas regiões tropicais.
O estudo também utilizou dados de satélite para estimar os impactos destes eventos na cobertura vegetal - as megassecas ecológicas. As anomalias do índice de vegetação (kNDVI) identificadas através dos dados de satélite refletem a saúde da vegetação durante esses eventos extremos. Este é um indicador importante de como os ecossistemas reagem à escassez de água e à falta de precipitação prolongada.
As megassecas ecológicas não se limitam apenas aos aspectos meteorológicos e climáticos das megassecas, mas que também afetam de maneira significativa a vegetação e os ecossistemas.
A análise mostra que eventos severos de megassecas ecológicas afetaram principalmente as pastagens temperadas, indicando uma grande perda de vegetação. Estes ecossistemas são formados principalmente por gramíneas e plantas herbáceas, encontradas em regiões de clima temperado, com verões quentes e invernos frios, sendo consideradas essenciais para a agricultura, especialmente para a criação de gado.
A crescente frequência e intensidade das megassecas, impulsionadas pelas mudanças climáticas, desencadeiam uma reação em cadeia de impactos ecológicos, econômicos e sociais. As secas prolongadas não apenas afetam a vegetação, mas também têm consequências diretas sobre a qualidade do solo, a agricultura e os recursos hídricos, fundamentais para a segurança alimentar e o abastecimento de água.
No Brasil, por exemplo, eventos como a seca no sudoeste da Amazônia e a crise hídrica no Sudeste, que afetaram a principal fonte de água de São Paulo, evidenciam a vulnerabilidade do país a esses fenômenos, afetando diretamente a vida urbana e rural.
O impacto econômico é significativo, com perdas em produtividade agrícola, aumento dos custos com abastecimento de água e custos de saúde devido ao estresse hídrico e a propagação de doenças. No cenário global, a maior intensidade das megassecas implica a necessidade urgente de adaptar políticas públicas, como a gestão de recursos hídricos, e ações de mitigação, a fim de reduzir os danos causados por esses eventos extremos.
A adaptação às mudanças climáticas é agora uma questão não apenas ambiental, mas também de saúde pública e estabilidade econômica, requerendo uma ação coordenada entre governos, empresas e sociedade para fortalecer a resiliência das populações frente aos impactos das megassecas.
Global increase in the occurrence and impact of multiyear droughts, Chen et al. (2025), Science.